domingo, 26 de outubro de 2014

POEMA PARA DILMA

POEMA PARA DILMA

Pedro Tierra

De onde vem essa mulher
que bate à nossa porta 500 anos depois? 
Reconheço esse rosto estampado 
em pano e bandeiras e lhes digo:
vem da madrugada que acendemos 
no coração da noite.

De onde vem essa mulher 
que bate às portas do país dos patriarcas 
em nome dos que estavam famintos 
e agora têm pão e trabalho? 
Reconheço esse rosto e lhes digo: 
vem dos rios subterrâneos da esperança,
que fecundaram o trigo e fermentaram o pão.

De onde vem essa mulher
que apedrejam, mas não se detém, 
protegida pelas mãos aflitas dos pobres 
que invadiram os espaços de mando? 
Reconheço esse rosto e lhes digo: 
vem do lado esquerdo do peito.

Por minha boca de clamores e silêncios 
ecoe a voz da geração insubmissa 
para contar sob sol da praça 
aos que nasceram e aos que nascerão 
de onde vem essa mulher. 
Que rosto tem, que sonhos traz?

Não me falte agora a palavra que retive 
ou que iludiu a fúria dos carrascos 
durante o tempo sombrio 
que nos coube combater. 
Filha do espanto e da indignação, 
filha da liberdade e da coragem, 
recortado o rosto e o riso como centelha: 
metal e flor, madeira e memória.

No continente de esporas de prata 
e rebenque, 
o sonho dissolve a treva espessa, 
recolhe os cambaus, a brutalidade, o pelourinho, 
afasta a força que sufoca e silencia 
séculos de alcova, estupro e tirania 
e lança luz sobre o rosto dessa mulher 
que bate às portas do nosso coração.

As mãos do metalúrgico, 
as mãos da multidão inumerável 
moldaram na doçura do barro 
e no metal oculto dos sonhos 
a vontade e a têmpera 
para disputar o país.

Dilma se aparta da luz 
que esculpiu seu rosto 
ante os olhos da multidão 
para disputar o país, 
para governar o país.