A
ÁRVORE - UMA CRÔNICA SOBRE A REALIDADE
Cleo
Lima
Uma
árvore talvez fosse pouco pra ele. Dependurar-se, pular de galho em galho, colher
suas frutas e saboreá-las no ato, sem cerimônia nenhuma. E a mãe que, medrosa,
gritava de longe: Desce, menino!
Adolescente,
recostava-se na sombra para uma soneca, para sonhar. Sonhar com a linda jovem
por quem se apaixonara… Com ela, rabiscou corações flechados e iniciais que
ficariam quase eternizados ali.
“Adultesceu”
a olhar para o verde manso das folhas defronte sua casa. Enxergava poesia no
movimento dos galhos, abria o peito, sentia o vento. Era uma sensação
inigualável, inexplicável. Por vezes, chamava a linda não-mais-tão-jovem e
ficavam os dois praticando o exercício da contemplação. Os sorrisos eram parte
integrante do cenário, que, de tão perfeito, parecia onírico.
As
crianças vieram. Logo que ensaiaram os primeiros passos, a primeira providência
foi amarrar um balanço num dos galhos. E logo os pequenos já subiam, desciam,
caíam e comiam os frutos. Era joelho ralado, braço roxo, picada de abelha.
Viviam gargalhando lá por cima.
Os
cabelos já eram poucos, totalmente brancos, quando aconteceu. Anunciou-se a
construção de uma estrada. Concreto. Asfalto. Preto.
Vieram os engenheiros, vieram os políticos sorrindo sempre, vieram as máquinas. Quando foi dado o sinal positivo, não houve tempo nem para as despedidas. Os netos pequenos choraram muito. Os filhos tentaram disfarçar a lágrima que se formava no canto do olho. Em vão. Ele e a linda senhora se abraçaram, tentando consolar um ao outro, mas não era nada simples, a tarefa.
Vieram os engenheiros, vieram os políticos sorrindo sempre, vieram as máquinas. Quando foi dado o sinal positivo, não houve tempo nem para as despedidas. Os netos pequenos choraram muito. Os filhos tentaram disfarçar a lágrima que se formava no canto do olho. Em vão. Ele e a linda senhora se abraçaram, tentando consolar um ao outro, mas não era nada simples, a tarefa.
Os
dois se foram no mesmo dia, parece até que tinham combinado. Após terem sido
cremados, as cinzas foram guardadas na mesma urna. O filho mais velho, chorando
muito, esperou as primeiras horas do dia seguinte. Caminhou sobre o asfalto
implacável, urna em mãos, e sentou-se onde outrora estivera a amada árvore.
Abriu a última morada dos pais. O vento, poesia pura, carregou devagarinho as
cinzas pela imensidão preta da estrada. E o dia nasceu.
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