PELADA DE SUBÚRBIO
Armando Nogueira
Nova
Iguaçu, quatro horas da tarde, sábado de sol. Dois times suam a alma numa
pelada barulhenta; o campo em que correm os dois times abre-se como um clarão
de barro vermelho cercado por uma ponte velha, um matagal e uma chácara
silenciosa, de muros altos.
A
bola, das brancas, é nova e rola como um presente a encher o grande vazio de
vidas tão humildes que, formalmente divididas, na verdade, juntam-se para
conquistar a liberdade na abstração de uma vitória.
Um
chute errado manda a bola, pelos ares, lá nos limites da chácara, de onde é
devolvida, sem demora, por um arremesso misterioso. Alguns minutos mais tarde,
outra vez a bola foi cair nos terrenos da chácara, de onde voltou lançada com
as duas mãos por um velhinho com jeito de caseiro.
Na
terceira, a bola ficou por lá; ou melhor, veio mas, cinco minutos depois,
embaixo do braço de um homem gordo, cabeludo, vestido numa calça de pijama e nu
da cintura para cima. Era o dono da chácara.
A
rapaziada, meio assustada, ficou na defensiva, olhando: ele entrou, foi andando
para o centro do campo, pôs a bola no chão e, quando os dois times ameaçavam
agradecer, com palmas e risos, o gesto do vizinho generoso, o homem tirou da
cintura um revólver e disparou seis tiros na bola.
No
campo, invadido pela sombra da morte, só ficou a bola, murcha.
Do livro "Os melhores da crônica brasileira", José Olympio Editora - Rio de Janeiro, 1977, pág. 22, extraímos
o texto acima.
Imagem Google
Nenhum comentário:
Postar um comentário