terça-feira, 10 de abril de 2012

LÁGRIMAS

(Imagem: Flickr, do álbum de El Greene)


Cinco mulheres entram em um vagão do metrô de São Paulo lendo silenciosamente uma carta. Logo deixam as folhas de papel sobre os bancos e, em prantos, saltam na próxima estação. Ao lerem o documento, os curiosos passageiros veriam tratar-se de convite para exposição de artista plástica francesa, realizada durante evento anual de literatura no Brasil.

Apesar de tudo, lágrimas ainda movem e comovem. Mais que expressar emoções, cutucam a miséria de nossa condição humana. Mohamed Said Fellag, escritor, humorista e comediante nascido na Argélia, confessou certa vez chorar sozinho nos bastidores antes de seus espetáculos. E o fazia porque se lembrava das vítimas e amigos mortos em chacinas naquele país africano, então assolado por uma guerra civil. “Dou risadas para não me suicidar”, declarou ele a uma jornalista. O poeta norte-americano Theodore Roethke também denunciou lágrimas  e solidão quando disse: “Choro pelo que sou quando estou sozinho”.

Ao ser informada, num leito de hospital, de que o bombeiro que se lançara nas águas de um rio  para salvá-la da morte fora, ele próprio, arrastado pela correnteza, a moradora de rua em São Paulo caiu em prantos. Só conseguiu dizer uma coisa à viúva do soldado, que segurava à sua frente um ramalhete de flores: pediu desculpas.

“Chorar é diminuir a profundidade da dor”, escreveu Shakespeare. A convicção é de que chorar sempre alivia e traz sensação de bem-estar. Mas uma nova visão, a partir de estudo realizado com mais de cinco mil pessoas em 35 países, mostra que quase vinte por cento delas tiveram sensações desagradáveis depois do choro, que as fizeram se sentir pior.

É pouco provável que orgulho ou vaidade leve alguém a choro verdadeiro. Único animal capaz de chorar, o ser humano começa a conviver com as lágrimas a partir dos seis meses de idade, ri em média 90 vezes por dia até os três anos e, na adolescência, tem esse número reduzido à média de vinte manifestações de alegria diárias. Curioso declínio do riso, que com o passar do tempo pode, em muitas ocasiões, ser lido como  um choro disfarçado.

Soube dia desses de uma carpideira que trocou o aluguel de suas lágrimas pelo samba, animando eventos no litoral paulista. Na Pensilvânia, Estados Unidos, uma jovem está impedida de chorar por sofrer de urticária aquagênica – rara alergia à água, que causa erupções dolorosas na pele podendo, inclusive, levar à morte.

Dor de viver e conviver – eis o que faz de nós seres atrelados às lágrimas e, por extensão, à misericórdia. Como dispensadores e, sobretudo, merecedores dela.

Eduardo Lara Resende



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