sábado, 23 de abril de 2011

PORQUE HOJE É SÁBADO...




BACALHAU COM FARINHA

Efigênio Moura


Quarta feira de trevas. Já perto das 6 da noite, hora da Ave Maria, caminho escuro, caminhavam em passos lentos Pitombão e Isabel com destino a Anjiquinho, onde moravam.

Nas costas de Pitombão, um saco de feira, nas mãos de Isabel um embrulho muito bem acariciado, bendito e desejado. Em cima um pouquinho de lua, em baixo os olhos alumiavam o caminho. O casal quase que não se continha de alegria com o presente que ganharam de Beth, lá da Monteiro Fm: 1 quilo de bacalhau.

Nunca comeram bacalhau, havia uma vaga lembrança do nome do tempo em que Chacrinha ainda era vivo. Bacalhau era peixe de rico.

A feira mirradinha não pesava quase nada, mas as bocas cheias d’agua atrapalhavam o caminhar…

- To guentano não Zabé, da vontade de cumê cru.

- Sabia qui nos istrangeiros tombem se come assim, cuma pasté ?

Caminhavam.

Após a AABB, viram a fazenda de Walter Farias, a luz do poste apagada, só um ‘fiapin’ de luz que parecia vir do candeeiro de dentro da casa de Vitô e Luzinete.

- Pronto agora qui num ando mais se num dé uma tacadinha nesse bicho…

- Peraí Pitombão, tu pensa quisso é cuma sardinha, qui nós abre e sai cumeno ? Ispin de peixe de rico é mortá.

- Agora lascô, vo cumê é agora.

E chegando à parede que dar acesso a casa de Vitô, largou o saco, pegou o pacote, desembrulhou , sentiu o cheiro salgado, rasgou um pedaço e…

- Pera homi, vô pegá a farinha.

Isabel agachou-se abriu o saco de farinha, pegou um punhado colocou na mão de Pitombão, que de uma vez só, jogou  o pedaço de bacalhau e a farinha na boca.

Nesse mesmo momento, Vitô abre a porta e vai fazer sua ronda semifinal nos arredores da sua casa, vai na casa grande, manda os cachorros se calar, caminha a passos preguiçosos com uma lanterna na mão, vai verificar o cadeado no portão quando ver os vultos.

Vitô se assustou. Parou e fixou o olhar nas sombras que o ‘restin’ de lumiar fazia.

Enquanto isso, Pitombão se engasgou, Isabel se agoniou…

- Devagar meu véi!

Pitombão gemeu um pouquinho.

- Isso meu véi, vagazin…

Vitô ouvindo. Pitombão agoniado.

- Hum, Hum

- Com jeitin meu véi, assiiiiiimm

Vitô se injuriando, Pitombão se mexendo.Isabel ajudando o marido.

- Ta arranhano ? Qué qui múie ?

Vitô não esperou, correu pra dentro de casa, assustado chamou Luzinete:

- Mulé cadê o revolvi, parece que tao acunhando na safadeza na no muro da casa…

- Vigi Maria!!! Tenha calma home, feché’ssa porta, deve de ser malassombro.

Sem agua e sem respirar direito, Pitombão mexia todo o corpo, e Isabel reclamava:

- Véi guluso, bem qui só divia ter deixado tu cheirá o danado.

Vitô não achando o revolver, agarrou uma espingarda antiga. E gritou…

- Magote de caba safado! Quem taí ?

Silencio, mas o pouco clarão da lua mostrava a sombra da luta de Isabel em querer segurar o corpo magro de Pitombão…

- Vô metê bala nesses cachorro, Luzinete.

- Vô acendê umas vela.

Do outro lado do muro, Isabel vendo o marido desfalecendo, grita:

- Reaje Pitombão!

Vitô se invocou:

- Vai ragir o que feladaputa!

- Reaje Pitombão! Seje Homi!!

- Venha seu malassonbro dos inferno, briga cum eu, apareça.

A porta entreaberta, a espingarda apontada pra fora

Nisso, Pitombão consegue engolir o pedaço de bacalhau com farinha e grita aliviado…

- Aiiiiiiiiiiiiiiii !

Nesse momento só se ouviu o pipoco no mêi do mundo…

Quase não dava tempo de Isabel e Pitombão pegarem suas coisas, deram uma carreira tão grande eu chegaram a Anjiquinho em menos de 10 minutos.

- Matasse Vitô ?

- Matei não mas butei pra corrê. Entre, vamo rezá, liga a televisão, tem um pádi de prantão essa hora lá.

Fechou a porta.


Site do autor: http://www.efigeniomoura.com.br/

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