domingo, 30 de junho de 2013

PRESENTE DE DOMINGO...

RECORDAÇÕES DE UM SÃO JOÃO NA ROÇA

José Maria Almeida Marques

Há anos-luz atrás, num sertão distante
quando ela me deu meu primeiro beijo
e aspirou assim o ar da minha boca
eu fiquei com medo e até pensando
que ela estava sugando minha alma.

Fazia frio, mas o frio que fazia
é porque era noite de São João
porém no céu víamos a Via-Láctea
e nossos corpos estavam tão quentes
como as fogueiras ao nosso redor.

Senti que ela estava me ferrando
como vaqueiros fazem com garrotes
dizendo, assim, esse cara é meu
ela com sua língua suave e doce
na minha boca com gosto de quentão.

A gente não falava quase nada
apenas arfávamos e nos tocávamos
como se fôssemos o centro da galáxia
únicos pulsares e quasares no universo
inaugurando o grande big bang inicial.

Ela exalava o cheiro mais melífluo
como nunca houvera sentido antes
eu então intuindo, naquele momento
que era tudo muito mágico e bonito
a explicação para o veloz ato de viver.

Até recordei, na hora, com raiva
de uns bestas de uns padres
que me disseram que aquilo
que estávamos fazendo imensamente
era uma coisa muito feia e suja.

Como pode, meu Deus, alguém dizer
que uma coisa daquelas não prestava
se era tudo tão bom, limpo e puro
que a gente chegava a pensar, até
que éramos alados e podíamos avoar?

Pois bem, naquela clara noite sertaneja
nós abraçados e encostados ali, no muro
do Grupo Escolar Telésforo Siqueira
nos amamos como nunca, nunca mais
estrelas chovendo sobre nossas cabeças.

Lembro ainda que ela me chamou amor
e eu lhe chamei de minha morena
atinando com o coração batendo forte
que aquele era o único legado bom
que os deuses haviam nos deixado.

Depois, ela me arrastou pelo braço
me levou para o salão do baile, iluminado
e dançamos 17 Légua e Meia, de Gonzaga
as pernas bambas e as almas em festa
nós dois, príncipe e princesa do reino.

Eu me sentindo o cara mais poderoso
da face da terra e gritando Shazam
eu e aquela moça linda e predadora
numa noite longínqua, século passado
sob o branco luar do Sertão do Araripe.

Do livro Concebidos com pecado


Imagem Google





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