MAMÃE
NOEL
Martha
Medeiros
Sabe por que Papai Noel
não existe? Porque é homem. Dá para acreditar que um homem vai se preocupar em
escolher o presente de cada pessoa da família, ele que nem compra as próprias
meias? Que vai carregar nas costas um saco pesadíssimo, ele que reclama até
para colocar o lixo no corredor? Que toparia usar vermelho dos pés à cabeça,
ele que só abandonou o marrom depois que conheceu o azul-marinho? Que andaria
num trenó puxado por renas, sem ar-condicionado, direção hidráulica e air-bag?
Que pagaria o mico de descer por uma chaminé para receber em troca o sorriso
das criancinhas? Ele não faria isso nem pelo sorriso da Luana Piovani! Mamãe
Noel, sim, existe.
Quem é a melhor amiga do
Molocoton, quem sabe a diferença entre a Mulan e a Esmeralda, quem conhece o
nome de todas as Chiquititas, quem merecia ser sócia-majoritária da
Superfestas? Não é o bom velhinho.
Quem coloca guirlandas
nas portas, velas perfumadas nos castiçais, arranjos e flores vermelhas pela
casa? Quem monta a árvore de Natal, harmonizando bolas, anjos, fitas e
luzinhas, e deixando tudo combinando com o sofá e os tapetes? E quem desmonta
essa parafernália toda no dia 6 de janeiro?
Papai Noel ainda está de
ressaca no Dia de Reis. Quem enche a geladeira de cerveja, coca-cola e champanhe?
Quem providencia o peru, o arroz à grega, o sarrabulho, as castanhas, o musse
de atum, as lentilhas, os guardanapinhos decorados, os cálices lavadinhos, a
toalha bem passada e ainda lembra de deixar algum disco meloso à mão?
Quem lembra de dar uma
lembrancinha para o zelador, o porteiro, o carteiro, o entregador de jornal, o
cabeleireiro, a diarista? Quem compra o presente do amigo-secreto do escritório
do Papai Noel? Deveria ser o próprio, tão magnânimo, mas ele não tem tempo para
essas coisas. Anda muito requisitado como garoto-propaganda.
Enquanto Papai Noel
distribui beijos e pirulitos, bem acomodado em seu trono no shopping, quem
entra em todas as lojas, pesquisa todos os preços, carrega sacolas, confere
listas, lembra da sogra, do sogro, dos cunhados, dos irmãos, entra no cheque
especial, deixa o carro no sol e chega em casa sofrendo porque comprou os
mesmos presentes do ano passado?
Por trás do protagonista
desse megaevento chamado Natal existe alguém em quem todos deveriam acreditar
mais.
[Martha Medeiros, Mamãe
Noel In: "Trem-bala", L&PM Editores - Porto Alegre, 2002, pág.
177.]
Imagem: foto tirada no
hall do prédio onde mora minha amiga Luciana Pires, que me hospeda no Recife.
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