CARTA ABERTA AO SÃO PEDRO
Boa tarde Exmo. Sr. São Pedro,
Venho pela presente redacção solicitar-lhe que seja benevolente para o dia de amanhã, da mesma forma que me prontifico a ser generoso no pedido.
Não lhe pedirei 30 graus e um sol abrasador, apenas uns pequenos raios de luz, um céu de tons ligeiramente mais claros, mais azuis. Não tenho a ambição de fazer praia, apreciava apenas poder aproveitar da melhor forma uma benesse que este governo ainda nos dá – a não aniquilação do 25 de abril*.
Bem sei que a sua posição não é fácil, não lhe permite conceder os desejos gerais, porque eles não são gerais. Uns lutam pelo sol, pelas esplanadas, outros pela bendita água que lhes salvará o cultivo, as colheitas. Oh tarefa difícil a sua. Hoje escreve-lho com esta veemente educação e apaziguadora prosa, por saber disso mesmo, dessa dificuldade que em nada lhe invejo. Eu tenho um patrão para agradar, Vossa Excelência tem um mundo, uma população sem fronteiras.
Por tudo isto lhe peço encarecidamente para ter, unicamente, especial atenção a este pequeno pedacinho de terra, à beira mar plantado. Portugal. Somos um povo simpático, de esforços inegáveis, não só na conquista do mundo, em que hoje governa a meteorologia, como também no exacerbante esforço que fazemos ao dobrar mais um cabo das tormentas, desta feita chamado de troika e vestido de austeridade. Não quero que tenha pena de nós, porque sei bem a forma como dai vê todos os que estão piores, bem piores, quero apenas que nos mime, um pequeno afago de 24 horas, que lhe agradeceremos eternamente. Desculpe, entusiasmei-me. É irreal dizer eternamente, não estou aqui para lhe mentir, provavelmente esqueceremos assim que nos traga o sol a miúde, mas amanhã será rei. Será o nosso rei.
Não querendo invadir a sua, suponho, preenchida agenda, gostaria de lhe solicitar um tempinho para pensar nesta minha proposta. Prometo não o voltar a aborrecer tão cedo, como prometo também não mais me esquecer de lhe agradecer sempre que nos bafeje com um deleitoso sol.
Sou apenas um, fácil de perder o rasto no meio da imensidão que governa, mas ainda assim hoje sinto-me altivo o suficiente para lhe fazer este pedido. Descabido? Exagerado? Talvez, mas o que me impediria de o fazer?
PS – Não tendo a certeza da sua omnipresença, agradecia assim a Deus que vendo esta carta a passasse a quem de direito.
Obrigado.
Ricardo Alves Lopes (Ral)
*O autor deve referir-se ao dia 25 de abril de 1974, data do golpe de Estado que derrubou o governo ditatorial de Portugal e ficou conhecido como “Revolução dos Cravos”.
A Wikipédia diz:
Revolução dos Cravos refere-se a um período da história de Portugal resultante de um golpe de Estado militar, ocorrido a 25 de abril de 1974, que depôs o regime ditatorial do Estado Novo, vigente desde 1933, e que iniciou um processo que viria a terminar com a implantação de um regime democrático, com a entrada em vigor da nova Constituição a 25 de abril de 1976.
“Foi talvez a mais linda festa política dos oito séculos de história de Portugal: a multidão, milhares de pessoas em estado de júbilo, dançava, cantava, chorava, sorria. E se abraçava, e abraçava os jovens soldados sem medo dos fuzis. E ocorreu então um caso extraordinário, até hoje sem explicação. Não se sabe como nem porquê, havia cravos vermelhos nas mãos do povo. Homens, mulheres e crianças de cravos nas mãos. Milhares de cravos. E o povo enfeitou de cravos os fuzis militares. E do povo a revolução ganhou nome: Revolução dos Cravos!”
Imagens Google
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