sábado, 4 de junho de 2011

PORQUE HOJE É SÁBADO...

Imagem Google

FÁBRICA DE CASAMENTO

Artur de Carvalho

Chegamos correndo. O casamento estava marcado para as sete horas. Já era sete e meia.

Apressamos o passo até onde permitia o salto alto da minha mulher.

— Calma, querido...

— Olha lá... já começou...

— Eu vou acabar quebrando o salto...

Entramos. Os noivos já estavam no altar.

— Tá vendo? Nem vimos a noiva entrando.

Os noivos lá, de costas. Eu conhecia um ou outro padrinho.

— Você sabia que o Almeida era padrinho?

— O Almeida?

— É... Olha ele lá.

— Puxa vida. Eu nem sabia que o Almeida conhecia os noivos...

O casal na frente da gente, além de ser o mais alto da igreja, não sentava nas horas que a cerimônia exigia.

Minha esposa e eu ficávamos olhando por entre os ombros deles.

— Quem é aquela, com o Ubiratam?

— O Ubiratam também é padrinho?

— Não. Olha ele ali, no terceiro banco. Quem é aquela com ele?

— Sei lá. Não é a esposa?

— Não. Deve ter separado.

— Separado? O Ubiratam?

As luzes das câmeras de vídeo atrapalhavam a visão. Ficavam atrás dos noivos, e não dava pra ver nada. O casal na nossa frente se abraçava. A gente tentava olhar em volta.

— Você viu o vestido da noiva?

— É. Eu sempre gostei de vestidos beges.

— Quem é que disse que é bege? É branco.

— Branco nada. Não tá vendo?

Os alto-falantes estavam com um pouco de microfonia, mas deu pra ouvir o sim dos dois.

— Você ouviu a voz dela? Deve estar chorando.

— É. Ela sempre fica emocionada nessas ocasiões. Imagine agora, no casamento...

— Olha lá... Aquela é a mãe dela?

— Sei lá... Eu não conheço... Mas deve ser...

— Nova, né?

As luzes das câmeras estavam mesmo insuportáveis. Ofuscavam tudo. Mas deu pra perceber que a cerimônia já estava acabando. Os padrinhos fizeram um círculo em torno dos noivos. Estavam descendo do altar.

— Vem cá. Vamos tentar ficar aqui perto, pra ela ver que a gente veio.

— Mas tem muita gente.

— Vem cá!

Os noivos desceram do altar. Todo mundo se aglomerou ao lado do corredor central, ornado com um tapete vermelho. Um homem me deu uma cotovelada, quando tentei passar à sua frente. Ficamos, minha mulher e eu, cercados por uma pequena multidão.

— Ela está passando! Ela está passando!

— Você viu o vestido? Eu falei que era bege!

— É branco. Não tá vendo?

Os noivos passaram. Atrás, os padrinhos. Deu pra ver o Almeida. Ele sorriu e fez um meneio com a cabeça. Eu sorri pra ele. Os ocupantes dos bancos foram se dispersando pela igreja. Começaram a chegar os convidados para o outro casamento. A coisa ficou meio tumultuada.

— Vamos embora, querida?

— Mas nós não vamos cumprimentar os noivos?

— Não. Vamos embora.

— Mas a gente precisa ver os noivos. Quer dizer, os noivos precisam ver a gente. Depois vão falar que a gente não veio.

— O Almeida me viu.

— Viu nada.

Saímos da igreja e fomos cumprimentar os noivos. Tinha fila. Uma confusão na frente da igreja. O outro casamento já ia começar. Ouvimos um sino. A nova noiva já estava entrando.

— Nossa.. Mas é um atrás do outro, hem?

— É. Parece fábrica.

Finalmente, chegou a nossa vez. A noiva estava de costas, cumprimentando o Ubiratam. Ela estava de branco, afinal de contas. Aí, a noiva se virou. Minha mulher arregalou os olhos. Eu disfarcei. Dei um beijo, desejei felicidades. Minha mulher fez o mesmo.

Saímos da fila e voltamos correndo para dentro da igreja. Minha mulher reclamou.

— Calma... Cuidado com o salto.

Entramos e olhamos para o altar. Os noivos já estavam lá, de costas.

— Caramba... Será que agora são eles?


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