domingo, 31 de julho de 2011

PRESENTE DE DOMINGO...


O POEMA

Um poema como um gole d´agua bebido no escuro.
Como um pobre animal palpitando ferido.
Como uma pequenina moeda de prata perdida para
sempre na floresta noturna.
Um poema sem outra angústia que a sua misteriosa
condição de poema.
Triste.
Solitário.
Único.
Ferido de mortal beleza.

Mario Quintana
In Aprendiz de Feiticeiro


sábado, 30 de julho de 2011

PROGRAMAÇÃO DA FESTA DAS NEVES 2011


A programação da Festa das Neves deste ano inclui 16 shows de artistas e grupos locais e nacionais, sendo dois por noite. A abertura, no dia 30 de julho, será animada pelo cantor mineiro Vander Lee, por volta das 23h.

Antes, às 21h, quem sobe ao palco é a cantora paraibana Mira Maia. Destaque também para a apresentação de Zé Lezin, no dia 3 de agosto, que vai homenagear o humorista Shaolin, que se recupera de um acidente automobilístico.

Confira abaixo a programação completa da Festa das Neves 2011:

Shows
Local: Ponto de Cem Réis
Horário: a partir das 21h

30/07 (sábado)
Mira Maia
Vander Lee

31/07 (domingo)
Polyana Resende
Quarteto em Cy

01/08 (segunda-feira)
Cabruêra
Banda Eddie

02/08 (terça-feira)
Banda Tuaregs
Marcio Greyck

03/08 (quarta-feira)
Banda Auto Pista
Bartô Galeno
Show de Zé Lezin (homenagem a Shaolin)

04/08 (quinta-feira)
Banda Sonora Samba Groove
Banda Black Rio

05/08 (sexta-feira)
Orquestra de Câmara Cidade de João Pessoa
Zélia Duncan

06/08 (sábado)
Paulo e Babi
14 Bis

‘Encontro Nacional de Cultura Popular Tradicional’
Local: Ponto de Cem Réis
Horário: a partir das 19h

30/07 (sábado)
Babau Joaquim Guedes (Bairro dos Novais)
Grupo de Maceió (AL)
Cavalo Marinho de Bayeux (Bayeux)
Coco e Ciranda de Caiana dos Crioulos (Alagoa Grande-PB)

31/07 (domingo)
Grupo de Natal (RN)
Congos de Pombal (Pombal-PB)
Ciranda de Vó Mera e seus Netinhos (Rangel/ João Pessoa-PB)
Coco do Mestre Zé Zuca (Queimadas-PB)
Grupo de São Luiz (MA)

01/08 (segunda-feira)
Babau de Nestre Clébio (Guarabira-PB)
Lapinha de São Sebastião (Bairro dos Novais/ João Pessoa-PB)
Coco do Mestre Benedito (Cabedelo-PB)
Coco do Galo Preto (Recife-PE)

02/08 (terça-feira)
Babau do Mestre Clóvis (Guarabira-PB)
Jongo do Pinheiral (RJ)
Nau Catarineta (Cabedelo-PB)
Lindalva e Lavadeira (Várzea Nova/ Santa Rita-PB)
Coco Novo de Quilombo de Gurugi (Natuba/ Conde-PB)

03/08 (quarta-feira)
Cavalo Marinho Infantil do Mestre João do Boi (Bairro dos Novais/ João Pessoa-PB)
Ciranda Nova Odete de Pitar (Pilar-PB)
Grupo de Lagoa Santa (MG)
Grupo de Belo Horizonte (MG)

04/08 (quinta-feira)
Zezinho da Borborema e Curió de Bela Rosa (Guarabira-PB e Pedras de Fogo-PB)
Coco da Baía da Traição (Aldeia Cumaru/ Baía da Traição-PB)

05/08 (sexta-feira)
Boi de Reis Estrela do Norte (Bairro dos Novais/ João Pessoa-PB)
Maracatu do Camaleão (Olinda-PB)
Grupo de Manaus (AM)
Reisado de Zabelê (Zabelê-PB)
Ciranda dos Tupinambás (Mandacaru/ João Pessoa-PB)
Documentário ‘Missão de Pesquisas Folclóricas’, de Mário de Andrade (1938), com 25 minutos (SP)

06/08 (sábado)
Grupo de Laranjeiras (PB)
Penha Cirandeira (Várzea Nova/ Santa Rita-PB)
Banda Cabaçal do Mestre Zé Pretinho (Tavares-PB)
Grupo de Vitória (ES)

PORQUE HOJE É SÁBADO...


DO CADERNO H

Mário Quintana*

A Arte de Ler
O leitor que mais admiro é aquele que não chegou até a presente linha. Neste momento já interrompeu a leitura e está continuando a viagem por conta própria.

A Carta
Quando completei quinze anos, meu compenetrado padrinho me escreveu uma carta muito, muito séria: tinha até ponto-e-vírgula! Nunca fiquei tão impressionado na minha vida.

A Coisa
A gente pensa uma coisa, acaba escrevendo outra e o leitor entende uma terceira coisa... e, enquanto se passa tudo isso, a coisa propriamente dita começa a desconfiar que não foi propriamente dita.

As Indagações
A resposta certa, não importa nada: o essencial é que as perguntas estejam certas.

A Voz
Ser poeta não é dizer grandes coisas, mas ter uma voz reconhecível dentre todas as outras.

Ars Longa
Um poema só termina por acidente de publicação ou de morte do autor.

Arte Poética
Esquece todos os poemas que fizeste. Que cada poema seja o número um.

Biografia
Era um grande nome — ora que dúvida! Uma verdadeira glória. Um dia adoeceu, morreu, virou rua... E continuaram a pisar em cima dele.

Cartaz para uma feira do livro
Os verdadeiros analfabetos são os que aprenderam a ler e não lêem.

Citação
De um autor inglês do saudoso século XIX: "O verdadeiro gentleman compra sempre três exemplares de cada livro: um para ler, outro para guardar na estante e o último para dar de presente."

Citação 2
E melhor se poderia dizer dos poetas o que disse dos ventos Machado de Assis: "A dispersão não lhes tira a unidade, nem a inquietude a constância."

Contradições
... mas o que eles não sabem levar em conta é que o poeta é uma criatura essencialmente dramática, isto é, contraditória, isto é, verdadeira.
 E por isso, é que o bom de escrever teatro é que se pode dizer, como toda a sinceridade, as coisas mais opostas.
Sim, um autor que nunca se contradiz deve estar mentindo.

Cuidado
A poesia não se entrega a quem a define.

Das Escolas
Pertencer a uma escola poética é o mesmo que ser condenado à prisão perpétua.

Destino Atroz
Um poeta sofre três vezes: primeiro quando ele os sente, depois quando ele os escreve e, por último, quando declamam os seus versos.

Do Estilo
O estilo é uma dificuldade de expressão.

Dos Leitores
Há leitores que acham bom o que a gente escreve. Há outros que sempre acham que poderia ser melhor. Mas, na verdade, até hoje não pude saber qual das duas espécies irrita mais.

Dos Livros
Há duas espécies de livros: uns que os leitores esgotam, outros que esgotam os leitores.

Dupla Delícia
O livro traz a vantagem de a gente poder estar só e ao mesmo tempo acompanhado.

Educação
O mais difícil, mesmo, é a arte de desler.

Fatalidade
O que mais enfurece o vento são esses poetas invertebrados que o fazem rimar com lamento.

Feira de Livro
O que os poetas escrevem agrada ao espírito, embeleza a cútis e prolonga a existência.

Leitura
Se é proibido escrever nos monumentos, também deveria haver uma lei que proibisse escrever sobre Shakespeare e Camões.

Leitura 2
Livro bom, mesmo, é aquele de que às vezes interrompemos a leitura para seguir — até onde? — uma entrelinha... Leitura interrompida? Não. Esta é a verdadeira leitura continuada.

Leituras
— Você ainda não leu O Significado do Significado? Não? Assim você nunca fica em dia.
— Mas eu estou só esperando que apareça. O Significado do Significado do Significado.

Leituras 2
Não, não te recomendo a leitura de Joaquim Manuel de Macedo ou de José de Alencar . Que idéia foi essa do teu professor?
Para que havias tu de os ler, se tua avozinha já os leu? E todas as lágrimas que ela chorou, quando era moça como tu, pelos amores de Ceci e da Moreninha, ficaram fazendo parte do teu ser, para sempre.
Como vês, minha filha, a hereditariedade nos poupa muito trabalho.

Lógica & Linguagem
Alguém já se lembrou de fazer um estudo sobre a estatística dos provérbios? Este, por exemplo: "Quem cospe para o céu, na cara lhe cai". Tal desarranjo sintático faria a antiga análise lógica perder de súbito a razão.

O Assunto
E nunca me perguntes o assunto de um poema: um poema sempre fala de outra coisa.

O Poema
O poema essa estranha máscara mais verdadeira do que a própria face.

O Trágico Dilema
Quando alguém pergunta a um autor o que este quis dizer, é porque um dos dois é burro.

Palavra Escrita
Por vezes, quando estou escrevendo este cadernos, tenho um medo idiota de que saiam póstumos. Mas haverá coisa escrita que não seja póstuma? Tudo que sai impresso é epitáfio.

Poema
Mas por que datar um poema? Os poetas que põem datas nos seus poemas me lembram essas galinhas que carimbam os ovos...

Poesia & Lenço
E essa que enxugam as lágrimas em nossos poemas com defluxos em lenços... Oh! tenham paciência, velhinhas... A poesia não é uma coisa idiota: a poesia é uma coisa louca!

Poesia & Peito
Qual Ioga, qual nada! A melhor ginástica respiratória que existe é a leitura, em voz alta, dos Lusíadas.

Refinamentos
Escrever o palavrão pelo palavrão é a modalidade atual da antiga arte pela arte.

Ressalva
Poesia não é a gente tentar em vão trepar pelas paredes, como se vê em tanto louco aí: poesia é trepar mesmo pelas paredes.

Sinônimos
Esses que pensam que existem sinônimos, desconfio que não sabem distinguir as diferentes nuanças de uma cor.

Sonho
Um poema que ao lê-lo, nem sentirias que ele já estivesse escrito, mas que fosse brotando, no mesmo instante, de teu próprio coração.

Tempo
Coisa que acaba de deixar a querida leitora um pouco mais velha ao chegar ao fim desta linha.

Veneração
Ah, esses livros que nos vêm às mãos, na Biblioteca Pública e que nos enchem os dedos de poeira. Não reclames, não. A poeira das bibliotecas é a verdadeira poeira dos séculos.

Vida
Só a poesia possui as coisas vivas. O resto é necropsia.
Pensamentos extraídos do livro "Do Caderno H", Editora Globo - Porto Alegre, 1973, págs. diversas.


*Mário Quintana nasceu em 30 de julho de 1906.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

MANIFESTO PELA SALVAÇÃO DO RECIFE ANTIGO


Convidamos todos para participarem do Manifesto em prol da revitalização do Recife Antigo e de maior atuação para a segurança de todos que frequentam o belo, cultural, alternativo,boêmio amante,nostálgico e divertido lugar onde nasceu a capital pernambucana.

Rua do Bom Jesus

O intuito desse MANIFESTO é que a Prefeitura da Cidade do Recife tenha um plano de Revitalização do espaço, que antes era destinado aos boêmios e amantes da noite, porém que agora está entregue a traficantes e a assaltantes. Com as ruas escuras e esburacadas, o Recife antigo está totalmente entregue ao submundo de meliantes que aproveitam aqueles que ainda frequentam o bairro para furtar. Pontos de venda de drogas são frequentes no bairro, que pouco é policiado. Na verdade, é raro ver um carro da PM nas ruas do Recife antigo, assim acaba se tornando um ponto chave para pessoas que vendem drogas. Os comerciantes estão fechando as portas com medo da violência que apenas cresce por suas ruas e cada vez mais o lugar fica completamente abandonado e sem incentivo à cultura.

Marco Zero

Concorda com isso? Venha PROTESTAR conosco!

PEDIMOS, COM TODA GENTILEZA: NÃO LEVEM BANDEIRA DE PARTIDO POLÍTICO. Obrigado.

Dia 31.07.2011
Concentração às 15h30
Saída às 16h00

Local: Saída da Torre Malakoff

Qualquer Dúvida: (81) 9317-6244 (Aluízio) / (81) 8827-2158 ou (81) 9873-8869 (Jéssika)



quinta-feira, 28 de julho de 2011

GUY JOSEPH CONVIDA

Clique na imagem para vê-la em tamanho normal


28 DE JULHO...

DIA NACIONAL DO COMBATE AO COLESTEROL

Ilustração: Francisco Tavares


DIA MUNDIAL DE COMBATE À HEPATITE




terça-feira, 26 de julho de 2011

domingo, 24 de julho de 2011

PRESENTE DE DOMINGO...

Fonte imagem http://www.comcausa.org.br/2011/07/luta-pela-vida/

CHACINA DA CANDELÁRIA

Glória Braga Horta

Às crianças covardemente arrancadas de seus sonhos. (RJ, julho de 1993)

Nesta terra de mil flores
de néctares,
de passarinhos
borboletas, pirilampos,
de matas, mares,
de amores…

Meninos são fuzilados
na noite fria,
estrelada,
na divina escadaria
do templo nobre
e sagrado.

Mortas sob o manto azul
onde reinam
as Três Marias
e as estrelas que desenham
nosso Cruzeiro
do Sul.

Nesta terra de ouro e mel,
Crianças são
Chacinadas
sob os astros luminosos
que formam a Chave
do Céu.

Crianças que nascem nuas
são cobertas
de rajadas
dos fuzis de homens-feras
de garras frias
e cruas.

Engraxates, andarilhos,
sem acalanto
nem canto,
só o ritmo metálico
dos disparos
dos gatilhos…

Crianças abandonadas,
culpa não têm
das drogas,
delinquências, armadilhas
em que caem
enredadas.

Nesta terra de esperança,
também há fel,
desencantos,
e da escura madrugada
ficou a cruel
lembrança.

Bandos com fuzis nas mãos
Apareceram
das sombras,
e com ódio e violência
mataram nossos
irmãos.

– Não transfigurem imagens
feitas à Imagem de
Deus!
Deixem que viva a Infância,
ó covardes, virem
Homens!

– Não matem nossas Crianças!
Em vez de pranto
e de dores,
deixem que durmam e acordem
com o canto
dos passarinhos

nesta terra de mil flores,
de néctares
e de amores.


Os nomes dos oito mortos no episódio encontram-se inscritos em uma cruz de madeira, erguida no jardim em frente à Igreja:

Paulo Roberto de Oliveira, 11 anos
Anderson de Oliveira Pereira, 13 anos
Marcelo Cândido de Jesus, 14 anos
Valdevino Miguel de Almeida, 14 anos
“Gambazinho”, 17 anos
Leandro Santos da Conceição, 17 anos
Paulo José da Silva, 18 anos



Por quem os sinos dobram

Na madrugada da chacina, em julho de 1993: apoio aos sobreviventes
Foto: Antonio Nery/Ag. O Globo

Yvonne Bezerra de Mello se tornou conhecida nacionalmente depois da chacina da Candelária, ocorrida em 23 de julho de 1993, quando oito meninos que costumavam dormir nas imediações da igreja foram assassinados. Conhecida pelas crianças, foi a Yvonne que elas recorreram para pedir ajuda no meio da madrugada. "Tia, aconteceu uma coisa horrível, uma chacina", disse uma vozinha pelo telefone. Foi ela quem transportou os sobreviventes para a delegacia e depois, ao longo dos anos, lutou pela condenação dos responsáveis (três ex-policiais foram condenados). Mas a comoção provocada pela chacina não serviu para melhorar as condições de vida dos jovens sobreviventes. "Na verdade, uma pesquisa realizada no rádio na época mostrou que uma boa parte da população apoiava a chacina", lembra Yvonne com amargura. Segundo seu último levantamento, das sessenta crianças que sobreviveram, 42 tiveram morte violenta desde então.


Fonte http://veja.abril.com.br/vejarj/240506/perfil.html


A chacina aconteceu em 23/07/1993.

sábado, 23 de julho de 2011

PORQUE HOJE É SÁBADO...



Oração para Antônio Maria, pecador e mártir

Vinicius de Moraes

"Nós saíamos os dois do "Vogue", e depois de deixar Aracy no táxi que a levava ao seu subúrbio, seguíamos de carro até o Leblon, às vezes acompanhando a matilha madrugadora de vira-latas a transitar entre as calçadas do Jardim de Alá; havia sempre um que parava para fazer pipi, o que provocava o reflexo dos outros, e era aquela mijação feliz — que eu nunca vi raça de bicho mais contente da vida que vira-lata carioca ao nascer do Sol. Parecia, mal comparando, uma fileira de lingüiças semoventes, uma a cheirar o rabinho da outra.

Você ria uma grande gargalhada, contente com o seu Cadillac velho, com a explosão da aurora no mar, com os vira-latas transeuntes e com seu novo amigo e poeta. E depois de passar pela casa de Caymmi, para ver se o baiano ainda ralentava a noite, acabávamos nos Pescadores enfrentando um filé com fritas, ou uns ovos com presunto — os melhores de Copacabana, porque eram feitos para a nossa grande fome. O pão era fresco e a cerveja bem gelada. Depois você me deixava em casa, eu dilacerado de saudades de tudo: de você, das conversas na boate amiga, onde dois barões, von Schiller e von Stuckart, disputavam em carinho e gentileza. E sobretudo da mulher amada ainda não tida. Você, maciste ao volante, cantava a marcha que tinha feito para a minha infinita dor-de-corno:

É muito tarde pra esperar por ela
Ela não vem ouvir a tua voz
Esquece, amigo porque a vida é bela
A noite é grande e cabe todos nós...

Um elo forte e viril se fizera entre nossas almas, e nós passamos a ser imprescindíveis um ao outro. A noite — que esperança! — não era grande, era pequena para a nossa gula de vivê-la em toda a sua plenitude. Tudo passava tão rápido, nós olhávamos as moças dançando, Aracy cantava, surgia a figura amiga de Fernando Ferreira, de repente a porta da boate deixava filtrar a luz da manhã. "Ele", como dizia Américo Marques da Costa, tinha despontado. Mais um dia, mais uma morte. Muitas mortes morremos nós, meu Maria, antes que a sua acontecesse para deixar-me mais só vivendo as minhas. Tantos já se foram, atraídos pela Grande Noite... Evaldo Rui, Bicudo, Stuckart, Waldemarzinho, Louis Cole, Alzirinha, Mauro, Dolores, Ozorinho, Ismael Filho, Ari... Mas em compensação ai estão Paulinho Soledade e Carlinhos Niemeyer, respirando por um fole só, mas cada dia fazendo mais viração; Verinha, esse amor de Verinha, uma graça total, a nossa boa Araça, rainha das vagotônicas, e o querido Rinaldinho, que neste particular nada lhe fica a dever, ele e sua gargalhada que o rádio silenciou. E de vez em quando ainda acontece uma grávida, em geral moça do Norte. Porque a verdade, meu Maria, é que depois da pílula, moça carioca quase não muda mais de silhueta. Às vezes eu fico pensando. Não sei se você gostaria de estar vivo agora, meu Maria, depois de 1964. Tudo piorou muito, o governo, o meu caráter, a música. Agora só se faz música para Festival e perdeu-se aquela criatividade boa e gratuita da década de 50. Todo mundo faz música com objetivo: comprar apartamento, ter um carrinho, ganhar popularidade, dobrar o cachê, vencer Festival, namorar as moças, bater papo furado. Isso não quer dizer que os caras não sejam ótimos compositores: eles o são. Mas tudo é feito num espírito muito toma-lá-da-cá, cada-um-por-si-e-Deus-por-todos. Assim, a meu ver, perde a graça. Aliás, não é culpa deles. Em absoluto. É o "esquema", como está em moda falar. Eles têm que estar na onda, senão não tem apartamento, não tem carro, não tem cachê, não tem Festival, o papo micha e as moças não dão. Ficam, por assim dizer, marginalizados, e aí nem o "Globo" nem a "Record" querem nada com os infelizes. Em resumo, meu Maria, não se perdeu a música; perdeu-se a sua dignidade.

Mas por um motivo eu sei que você gostaria de estar vivo: as moças.  Elas estão, meu Maria, cada dia mais lindas e esportivas, havendo mesmo uns espécimes de se espetar na parede com alfinete. E acho que você iria gostar do "Antonio's", um restaurante novo do Leblon onde todo mundo vai, e tem de certo modo o espírito do velho "Maxim's" dos anos 51/53.

De vivo mesmo, meu bom Maria, há Oscar Niemeyer e Di Cavalcanti, certamente os dois maiores homens do atual Brasil. Di está, nos seus 70, a coisa mais jovem, trêfega, inteligente e lírica do mundo, pintando cada dia mais lindo e batendo o melhor papo da República. E Oscar então, desse nem se fala. Elevou-se muito acima de todos, pelo gênio, pela consciência política, pela compreensão humana, pela simplicidade autêntica.

E há os estudantes. Estão maravilhosos, e dando lição de cultura aos pais e professores. Saem à rua como um fogo que se alastra, fazendo comícios relâmpagos, topando as paradas com a polícia e conseguindo unir todas as camadas da população, com exceção dos milicos. Outro dia nós saímos em passeata cívica, e éramos 100.000 na Avenida Rio Branco: estudantes, intelectuais, clero, donas de casa, protegidos por um extraordinário esquema de segurança bolado pelos próprios garotos. Uma beleza. Se alguma coisa de bom tem que sair deste país, vai ser à base do novo movimento estudantil. E, naturalmente, Chico Buarque de Holanda."